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O filósofo Kierkegaard considera a angístia como sendo uma determinação que revela a condição espiÂritual do homem, caso se manifeste psicologicamente de maneira ambígua e o desperte para a possibilidaÂde de ser livre.
A angístia é a terrível agonia que limita o ser na estreiteza das paredes da insatisfação, faceà falta de objetivo e de essencialidade da existência.
Resultado de inímeros desconfortos morais, exÂpressa-se em desinteresse doentio e afugente, que punÂge o ser, levando-o a graves transtornos psicológicos.
Radicada no Espírito, exterioriza-se como ressenÂtimento da vida, processo de desestruturação da perÂsonalidade, azedume e infelicidade.
Na infância, sem dívida, se encontram os fatores que produziram o amargor, quando a rejeição dos pais e familiares conspirou contra o amadurecimento emoÂcional, alardeando pessimismo em torno da criança, que foi brutalizada, desestimulada de promover qualquer reação em favor de si mesma e dos valores que se lhe encontravam adormecidos, suprimindo-lhe o direito a uma existência saudável.
A morte dos objetivos existenciais deu-se, a pouco e pouco, graças aos espículos das injustiças implacáÂveis que a desnortearam quando ainda em formação, apresentando-lhe sempre a sua incapacidade para triÂunfar, a ausência de recursos para merecer respeito e consideração, a insistente e rude violação dos seus diÂreitos como ser humano.
Sentindo-se desrespeitada e odiada, não tendo espaço para a catarse dos dramas íntimos que se lhe desenhavam nos painéis da mente, deslocou-se do mundo infantil iluminado, refugiando-se na caverna sombria da amargura, que passou a comandar as suas aspirações, embora de pequena monta, termiÂnando por turbar-lhe as paisagens do sentimento e da emoção.
À medida que se foram estabelecendo os contorÂnos e conteídos da amargura, os resíduos psíquicos pessimistas se acumularam em forma de toxinas que passaram a envenenar-lhe os comandos mentais, enÂtorpecendo-lhe os neurotransmissores e perturbando-lhe as comunicações.
Ainda aí se podem contabilizar, nesse doloroso processo de instalação da angístia, os efeitos do comÂportamento desastroso em existência transata, quando malbaratou as oportunidades felizes que lhe foram conÂcedidas pela Vida, ou as utilizou indevidamente, proÂduzindo desaires e desconforto, quando não gerando desgraça de efeitos demorados.
Essas vítimas, tornaram-se cobradores inconseÂquentes daquele que delinquiu, hoje reencarnando-se na condição de pais e demais familiares, que se atribuÂíram, embora inconscientemente, os direitos de rejeiÂção ao ser que a Divindade lhes confiou para o procesÂso de crescimento e de reparação, nesse complexo e extraordinário movimento que é a vida.
Trazendo insculpida no inconsciente profundo a culpa, após um despertar doloroso para a realidade, o Espírito, que se reconhece indigno de auto-estima, merÂgulha no abismo da autopunição sem dar-se conta, torÂnando-se angustiado e, sobretudo, magoado em relaÂção a todos e a tudo.
A culpa não diluída é terrível flagício que dilacera o ser, seja conscientemente ou não, impondo a necessiÂdade da reparação do dano causado. Por isso mesmo, o perdão ao mal de que se foi objeto ouàquele que o inÂfugiu é de relevante importância. Não porém, apenas a quem agride, acusa ou malsina, mas também, e princiÂpalmente, a si mesmo. É indispensável que o indivíduo se permita o direito do erro, considerando, entretanto, o dever da reparação, mediante cujo esforço supera o constrangimento que a consciência do equívoco lhe impõe.
Não se trata de uma atitude permissiva para noÂvos equívocos, e sim, de um direito de ser humano que é, de lograr sucesso ou desacerto nos empreendimenÂtos que se permite, aprendendo mediante a experimenÂtação, que nem sempre se faz coroar de êxito. Não obsÂtante, quando se tem consciência do gravame, com haÂbilidade e interesse, é possível transformá-lo em bênÂção, porquanto, através dele, se aprende como não mais agir.
Não sendo assim conduzida, a ação tomba, em alÂgum tipo de processo perturbador, como o de natureza angustiante.
A óptica do paciente angustiado é distorcida em relaçãoà realidade, porque as suas lentes estão embaÂçadas pelas manchas morais dos prejuízos causados a outras vidas, tanto quanto em razão das injunções doÂlorosas a que se sentiu relegado.
Somente através do esforço bem direcionado em favor do reequilíbrio e utilizando-se de terapia especíÂfica, é que se torna possível a libertação do estertor da angístia, restabelecendo o comportamento saudável, recuperando os objetivos existenciais perdidos em raÂzão do estabelecimento de novos programas de vida.
Acostumadoà rejeição, e somando sempre os vaÂlores negativos que defronta pela jornada, o indivíduo enfermo estabelece o falso conceito da irreversibilidaÂde do processo, negando-se o direito de ser feliz, feliciÂdade essa que lhe parece utópica.
Adaptado emocionalmente ao cilício do sofrimento interno, qualquer aspiração libertadora assume proporÂções difíceis de serem ultrapassadas. Não obstante, o amor desempenha papel fundamental nesse contubérÂnio, transformando-se em terapia eficiente para o conÂflito desesperador.
Despertando para a afetividade, que lhe foi negaÂda, e que brota inesperadamente na área dos sentimenÂtos profundos, é possível ao paciente arregimentar poÂderes, energias para romper o círculo de força que o sitia, propondo-lhe uma releitura existencial e emulanÂdo-o ao avanço.
O amor preenche qualquer vazio existencial, por despertar emoções inusitadas, capazes de alterar a esÂtrutura do ser.
Quando asfixiado, continua vibrando até o momenÂto em que irrompe como força motriz indispensável ao crescimento interior que faculta amadurecimento e viÂsão correta das metas a serem alcançadas. ConcomitanÂtemente, o auxílio especializado de profissional comÂpetente torna-se essencial, contribuindo para a recomÂposição das paisagens emocionais danificadas.
O esforço pessoal, no entanto, é fator prepondeÂrante para o sucesso da busca da saíde psicológica.
Apesar de todo o empenho, porém, convém consiÂderar-se que surgem momentos na vida, nos quais, epiÂsódios de angístias se apresentam, sem que se torne abalada a harmonia emocional.
Desde que se façam controláveis e superados a breÂve tempo, expressam fenômeno de normalidade no transcurso da existência humana, porquanto, num comÂportamento horizontal, sem as experiências que se alÂternam, produzindo bem ou mal-estar, não se podem definir quais são as diretrizes de uma conduta realÂmente saudável e digna de ser conseguida.
Toda fixação que se torna monoideísta, eliminando a polivalência dos inímeros fenômenos que fazem parte do mecanismo da evolução, transforma-se em transtorno do comportamento, que conduz a patologiÂas variadas, dentre as quais, a amargura, que se expresÂsa como força autopunitiva, mecanismo psicótico-maÂníaco-depressivo que, não cuidado no devido tempo, sempre culmina em mal de consequências irreversíveis.
Joana de Ângelis – Psicografado por Divaldo franco