“Perdoai, Senhor, as nossas dívidas, assim como perdoamos
aos nossos devedores.
”
Nesta petição, Jesus, o Mestre por excelência, dá-nos a
conhecer uma lei eterna e imutável, a cujos efeitos todos, sem
exceção, estamos sujeitos.
Trata-se da lei do “dar e receber”, segundo a qual cada um
recebe da Justiça Divina exatamente de acordo com o que dá ao
próximo.
Há no Evangelho inúmeras referências a respeito.
Sirvam-nos
de exemplo as seguintes: “Se perdoardes aos homens as ofensas
que tendes deles, também vosso Pai celestial vos perdoará vossos
pecados; mas se não perdoardes aos homens, tampouco vosso Pai
celestial vos perdoará”.
(Mateus, 6:14 e 15.
) — “Não julgueis, e
não sereis julgados; não condeneis, e não sereis condenados;
perdoai e sereis perdoados.
Dai e dar- se-vos-á; qual for a medida
de que usardes para os outros, tal será a que se use para vós.
”
(Lucas, 6:37 e 38.
) — “Aquele que semeia pouco, também colhe
pouco; mas aquele que semear em abundância, também colherá
em abundância.
” (II Coríntios, 9:6.
)
Leiamos, ainda, a Parábola do credor incompassivo (Mateus,
18:23 a 35), em que a referida Lei é exposta com a máxima clareza
e, se quisermos garantir nossa bem- aventurança futura, tratemos
de observá-la, atentamente, em nossas relações com os que nos
cruzam pelo caminho.
Porque, se não formos capazes de perdoar
àqueles que nos ofendem ou prejudicam, também não seremos
perdoados das ofensas ou prejuízos com que tenhamos agravado
os nossos semelhantes e, nesse caso, nenhuma igreja, nenhum
mentor religioso, nenhum sacramento, nenhuma indulgência,
poderá valer-nos, de sorte a assegurar-nos a entrada no Reino
celestial.
Como nos explica Huberto Rohden (Metafísica do
Cristianismo), “em todas as línguas a palavra perdoar é um
composto de dar ou doar.
De maneira que perdoar quer dizer doar
completamente, abrir mão de si mesmo, dar ou doar o próprio Eu
a outrem; neste caso, o ofensor.
Em vez de imolar o ofensor a seu
ódio, o perdoador imola-se a si mesmo, o ofendido, na ara do seu
amor, abrindo assim de par em par as portas de sua alma ao influxo
das torrentes divinas”.
Outrossim, ensinando-nos a dizer: “Perdoai, Senhor, as nossas
dívidas, assim como perdoamos aos nossos devedores”, Jesus
nega e renega a doutrina das penas eternas, porquanto, se não
devêssemos esperar o perdão de Deus, inútil seria estar a pedi-lo.
Notemos, entretanto, e isso é importantíssimo: — esse perdão
que Ele nos acoroçoa a pedir não é a remissão pura e simples da
pena em que tenhamos incorrido.
Não! O Mestre o condiciona à
lei do “dar e receber”: ser-nos-á perdoado “assim como”
perdoarmos, o que vale dizer que enquanto formos rancorosos e
vingativos haveremos de estar sujeitos às sanções
correspondentes, e só quando perdoarmos plenamente aos que
ajam mal conosco é que as bênçãos celestiais haverão de envolver
nossos corações, impregnando-os de paz e felicidade.
Ora, se Deus faz do esquecimento das ofensas uma condição
absoluta, iria exigir de nós, fracos e imperfeitos, o que Ele,
onipotente e infinito em perfeição, não fizesse?
Fosse Deus inexorável para o culpado e insensível ao
arrependimento dos que o ofendem, negando-lhes por todo o
sempre os meios convenientes para que empreendam a própria
reabilitação, não seria misericordioso, e, não o sendo, deixaria de
ser infinitamente bom.
Resultaria daí que o homem que perdoa aos seus ofensores e
retribui-lhes o mal com o bem, seria melhor do que Ele, o que é
inconcebível.
Sabendo, pois, que Deus é Amor, mas é igualmente Justiça, e
que, pela sua Lei, “é dando que recebemos”, esforcemo-nos no
sentido de vencer quaisquer ressentimentos ou propósitos
inamistosos; antes de buscarmos o revide, cuja satisfação deixa
sempre amargos ressaibos, bendigamos os que nos ferem e
humilham, porque são instrumentos providenciais na lapidação de
nossas almas, fautores preciosos de nosso progresso espiritual.
Perdoemo-nos uns aos outros, não até “sete vezes, mas até
setenta vezes sete”, isto é, ilimitadamente (Mateus, 18:21 e 22).
Assim o fazendo, também o Senhor terá complacência para
conosco, cobrindo com seu amor a multidão de nossas culpas.
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