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Médium Christina Nunes – Rio de Janeiro Contribuição de Pedro

(Depoimento da Médium Christina Nunes – Rio de Janeiro – 16 de abril de 2017

“Como posso pagar por alguma coisa de que nem me lembro que fiz?”

“Não acho justo voltar para viver consequências de vidas das quais não me lembro. Nem mesmo tenho provas de que as vivi.”

“Por qual razão não nos recordamos de nossas vidas passadas?”

Desde o advento da Doutrina dos Espíritos não é exagero dizer que estas mesmas perguntas já foram feitas um número incontável de vezes, com respostas certamente bastante parecidas para esclarecê-las, oferecidas por palestrantes das tribunas das casas espíritas, em conversas informais sobre o tema, ou em tantas outras situações.

De fato, temos em O Livro dos Espíritos, cap. VIII, 393, o comentário elucidativo de Allan Kardec:

“A lembrança de nossas individualidades anteriores teria gravíssimos inconvenientes. Poderia, em certos casos, humilhar-nos extraordinariamente; em outros, exaltar o nosso orgulho e por isso mesmo entravar o nosso livre-arbítrio. Deus nos deu para nos melhorarmos justamente o que nos é necessário e suficiente: a voz da consciência e nossas tendências instintivas, tirando-nos aquilo que poderia prejudicar-nos. Acrescentemos ainda que, se tivéssemos a lembrança de nossos atos pessoais anteriores, teríamos a dos atos alheios, e esse conhecimento poderia ter os mais desagradáveis efeitos sobre as relações sociais. Não havendo sempre motivo para nos orgulharmos do nosso passado, é quase sempre uma felicidade que um véu seja lançado sobre ele. Isso concorda perfeitamente com a doutrina dos Espíritos sobre os mundos superiores aos nossos. Nesses mundos, onde não reina senão o bem, a lembrança do passado nada tem de penosa; é por isso que neles se recorda com frequência a existência precedente como nos lembramos do que fizemos na véspera. Quanto à passagem que se possa ter tido por mundos inferiores, a sua lembrança nada mais é, como dissemos, que um sonho mau”.

A explicação, por si, já diz bastante sobre o funcionamento sábio das leis divinas neste sentido, e o que pretendo neste texto, em lugar de repisar o que já é exaustivamente comentado em outras fontes competentes, é oferecer um testemunho pessoal, baseado em vivências recentes, e que considerei autêntico presente proporcionado pelos característicos do perfil mediúnico, para exemplificar, com fatos, as excelentes razões pelas quais é, mais do que conveniente, espiritualmente saudável voltar a cada vida com as lembranças do passado embotadas, a fim de que consigamos nos concentrar nas urgências da hora, importantes para o capítulo atual do nosso aprendizado evolutivo.

Refiro-me ao jet lag, efeito psicológico comum a muitos que se ausentam e voltam de período de viagem prolongada, durante o qual se situam fora do condicionamento dos hábitos e do ambiente do seu lugar de origem. O retorno se caracteriza por uma difícil fase depressiva, de deslocamento de identidade, e de recondicionamento gradual e necessário ao que é familiar, depois de um período em que nos vimos afastados do nosso habitat para uma realidade necessariamente diversa daquela com a qual convivemos todos os dias.

Em outras oportunidades, contei sobre alguns acontecimentos importantes de ordem mediúnica, indicativos das muitas vidas anteriores que vivi na Itália. Dentre muitas particularidades subjetivas, dois se destacaram: a convivência com o meu mentor desencarnado e autor de meus livros psicografados, e a visita ao Teatro di Marcello em estado de desprendimento espiritual, há muitos anos atrás – na época, sem ter a menor ideia do que fosse, e de onde ficava o prédio com dois mil anos de história, no coração da Roma antiga.

Assim, em agosto de 2016 obtive o enlevo da confirmação da viagem astral, ao deparar, em todo o seu porte majestoso, o edifício milenar. Podendo constatar, pessoalmente, a realidade dos pequenos e grandes detalhes visitados anteriormente, durante aquele estado projetivo impressionante – desde os aspectos pitorescos da arquitetura até o cenário circundante, com os arvoredos à direita e os restos imponentes do templo de Apolo, no largo dianteiro ao Teatro.

Mas, após essa breve digressão, o que nos interessa para o que comentamos neste artigo foram as sensações conflitantes que, durante e após a viagem, se confirmaram como provas incontestes da conveniência de serem encobertas as lembranças desnecessárias, na duração de cada reencarnação em que nos demoramos comprometidos com aprendizados de ordem diversa das jornadas anteriores.

Sim. Refiro-me até mesmo às lembranças boas! Porque mesmo essas podem ser, até certo ponto, de difícil assimilação.

Lembro-me de mim, ano passado, mergulhada num deslumbramento difícil de se descrever, enquanto me deliciava andando, com três amigas, nas ruas de Roma. Sentia-me em casa! Reconhecia o ar que respirava. Os prédios históricos. Os temperamentos. A sensação indiscutível de adivinhar os caminhos entrincheirados para dentro das muralhas e portas milenares da cidade dos Césares.

Quando dentro do Coliseu, em pleno verão escaldante, no meio daquelas centenas de pessoas espalhadas em grupos de turismo pelas aleias calcinadas do anfiteatro gigantesco, nossa guia romana, em meio a explicações várias, perguntou: – A arena do Coliseu era sempre coberta de areia. Alguém sabe explicar a razão?

– Para absorver o sangue… – Respondi, num ímpeto, realmente sem a contribuição do raciocínio e do pensamento. A resposta simplesmente subiu das entranhas da memória espiritual de séculos, diante da moça entre surpresa e curiosa, em vívida, autêntica manifestação do tão comentado déjà vu.

Foram, assim, cerca de dezoito dias em imersão completa num passado espiritual que reconheci em cada vírgula e til. Havia um único fio condutor, preso aqui, no Rio de Janeiro, como o cordão de prata que liga a alma ao corpo: a família, e os filhos, e as amizades queridas. Todo o resto de mim, todavia, se via preso lá, como se o meu presente fosse atirado para dentro do passado, que então o dominou por inteiro.

Eu não estava mais reencarnada no Brasil, e sim de volta à Itália. De corpo e espírito. Reconhecendo tudo em volta como algo querido e extremamente familiar – desde o clima, aos perfumes dos ares, idioma, paladar, os lugares e os temperamentos.

Experiência difícil de se descrever, no entanto, assombrosa, iniludível.

Quando, afinal, entrei no avião para voltar ao Rio de Janeiro, não conseguia conter os soluços e as lágrimas rolando pelo rosto, enquanto mais e mais as luzes noturnas de Roma iam ficando para trás, desaparecendo conforme ganhávamos altura. Mas é justo sobre esse sentimento que vale a pena se falar, para ilustrar com fatos o tema que discutimos. O sentimento experimentado, que muitos julgariam absurdo, do redespertamento de um orgulho desmedido por um país onde atualmente não nasci. Em contrapartida, uma angústia dolorosa, embora aparentemente despropositada, de ser obrigada a ir embora e deixar um lar que sentia em cada fibra da alma e do corpo como sendo meu.

Alguns poderiam argumentar que isso se trata da depressão comum a todo turista que durante algum tempo se condiciona a uma realidade agradável, livre de preocupações, em muitos aspectos melhor do que aquela que enfrentamos cotidianamente nas lutas diárias, no entanto, não se tratou disso. Considero-me realista o suficiente, porque viajei sabendo de antemão que, como aqui, nenhum lugar é totalmente maravilhoso.

A Itália também tem seus desacertos. Atualmente, lida com o gravíssimo problema da imigração maciça acolhida no país, em busca de oportunidades dignas que não são fáceis de se oferecer, ao menos num primeiro momento. País que enfrenta os receios bastante palpáveis do terrorismo, visíveis de forma ostensiva em cada ponto turístico onde o exército, fortemente armado, revista minuciosamente quem entra em suas basílicas e monumentos históricos. Vi em Roma indícios de pobreza, embora não tão expressivos quanto no Brasil. Riscos de pequenos furtos, alertados pelos guias turísticos àqueles de nosso grupo porventura mais distraídos. Bons e maus humores, lá, como aqui, comuns aos seres humanos de todas as latitudes geográficas.

O que se passou comigo, porém, diz respeito a algo a que nem tantos prestam a devida atenção; mas que avulta em quem lida de maneira rotineira com os fatos mediúnicos.

Houve um redespertamento ainda mais intenso de um repertório evolutivo anterior, que mesmo aqui já aflorava espontaneamente à tona de minhas reminiscências espirituais, antes da viagem – o que, aliás, hoje compreendo, foi o grande fator determinante do planejamento de toda uma vida para esta volta aos lugares das minhas vivências do passado. Ir a Roma e a Itália, desta forma, aconteceu, para mim de maneira particular, como um impactante episódio de imersão no pretérito, iniciado de forma maravilhosa, mas que, durante o seu desenvolvimento, e especialmente no seu término, realçou como prova contundente da razão pela qual é conveniente que nem de tudo nos recordemos, a cada volta ao corpo carnal em lugar diferente do anterior, dentre tantos onde já reencarnamos.

A constatação é a de que, mesmo em casos assim, de retorno a um local a quem devotamos amor extremo em função de um passado vasto de vivências com pessoas queridas, uma vez situados em nova experiência na matéria devemos priorizar os compromissos do presente, e esperar o momento certo para se recordar. Porque dói, quase fisicamente, acordar as lembranças distantes de um lugar onde não estão mais aquelas pessoas que inconscientemente devo ter buscado durante a minha curta estadia em Roma no ano passado, experimentando, em decorrência disso, um vazio emocional sofrido de ordem inexplicável. Fere, a sensação de se amar profundamente um lugar onde não mais podemos permanecer, porque não nascemos lá mais recentemente. Confunde, a sensação de se ver dividido espiritual e afetivamente em dois locais diferentes de um mesmo mundo: o de seu nascimento na atual vida corpórea, no qual estão todos os seres mais queridos da presente jornada, e o anterior, onde ainda residem latentes nas lembranças atávicas os rostos nebulosos, dos quais não conseguimos nos recordar com clareza no momento, mas que habitam agora outros lugares, envolvidos nos seus respectivos compromissos, nesta, ou em outras dimensões da vida eterna.

“Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer de novo não poderá ver o Reino de Deus.” – João, 3.

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