DESPERSONALIZAÇÃO – Livro – Amor Imbativel Amor 4/5 (1)

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O ser humano, embora antropologicamente seja portador de uma herança animal, é, antes de tudo, um Espírito, com possibilidades inimagináveis, que se lhe encontram em germe, e que à educação cumpre o mis­ter de despertar e desenvolver.
Em razão da sua realidade transpessoal, a finali­dade da sua existência é crescer, alcançando os pata­mares que lhe estão reservados, por fatalidade evoluti­va. No entanto, face à sua natureza animal, que não poucas vezes desconhece ou que lhe dá predominân­cia, aturde-se, sem saber como avançar.
Se não valoriza a condição na qual se encontra — as exigências do corpo — faz-se um autômato, porque lhe cumpre vivê-las, educando-as, superando os impulsos dos instintos básicos, para desenvolver os valores espi­rituais latentes.
Vencendo, a pouco e pouco, os automatismos psi­cológicos, que vão sendo orientados pelo senso crítico e pela razão, deve conduzir o corpo sem paixão, nem escravidão, realizando-se física e emocionalmente.
O corpo, como é natural, impõe inúmeros anseios e necessidades, que fazem parte da sua constituição biológica, e devem ser levados em conta, não obstante a sua realidade espiritual ser o comando básico da exis­tência. O ego, por conseqüência, tem suas raízes finca­das nele, e se as mesmas são arrancadas violentamen­te, corre o perigo de tornar-se esquizóide.
Faz-se necessário, portanto, que seja mantida uma inter-relação entre o passado — animal — e o presente, a fim de que, negando o seu corpo, não se tome um Espí­rito sem envoltório material, o que lhe tomaria impro­vável o processo de evolução. Alterando, porém, sub­vertendo a natureza animal — por falta de consideração pelo Espírito que é — transforma-se em um títere, um demônio, que desconhece os direitos dos outros e so­mente cultiva o primarismo dos instintos.
A luta travada pela cultura e pela civilização, a fim de que o corpo seja superado, tem propiciado situá-lo em nível mais elevado, em razão do raciocínio, do apro­fundamento da consciência, tornando mais radioso e belo o Espírito. Como efeito inevitável, tornou-lhe o corpo mais sensível, mais estético, portador de sensibi­lidade apurada, de percepção parafísica, alimentando­o com equilíbrio, exercendo-lhe as funções com respei­to.
Sem necessidade de agredir o corpo, mediante cilí­cios nem considerações deprimentes que o denigrem, vem o mesmo recebendo a consideração que merece, face ao valor que representa no processo de elevação mental e moral do ser.
Não obstante esse reconhecimento, vários fatores se apresentam como responsáveis pela despersonaliza­ção, tais como os sentimentos de terror, de culpa, que produzem a inibição respiratória e a dos movimentos, enjaulando o paciente nas celas escuras e sem paredes dos conflitos.
Essa conduta produz sensações indescritíveis, que o organismo procura vencer através da morte da sua realidade. O corpo, então, enrijece, a respiração faz-se com dificuldade e a falta de oxigênio no organismo pro­duz males psicológicos e físicos variados.
A autopercepção é profundamente afetada e os pacientes passam a sofrer emocionalmente sensações de difícil catalogação, que os levam ao desespero.
O eminente Eugen Bleuler, analisando a desperso­nalização que afeta os indivíduos incursos nessa dis­torção, considera que os sofrimentos creditados àque­les que lhe são vítimas, variam desde surras e queima­duras, a espetadas com agulhas, lâminas e punhais em brasa viva, amputações de membros, o semblante de­formado… e suplícios indescritíveis são experimenta­dos em um clima de horror crescente, que mais piora a patologia da personalidade.
A ausência de sentimentos responde por esses efei­tos, tendo-se em vista que o paciente matou o corpo, em mecanismo psicológico inconsciente, para fugir dos sintomas anteriores produzidos pelo terror. Concomi­tantemente, o portador de esquizofrenia, porque desti­tuído da capacidade de direcionar os sentimentos, tom­ba no vazio da sua própria realidade.
O indivíduo saudável é aquele que orienta as emo­ções organizadamente, lutando contra os obstáculos que se lhe apresentam, e que são parte do processo no qual se encontra mergulhado, o que mais lhe desen­volve a capacidade de crescimento e de armazenamen­to de conhecimentos.
Esse terror, gerador do grave mal, está quase sem­pre vinculado a condutas vivenciadas na infância, quan­do se foi vítima da negligência ou da crueldade de pais insensíveis, que promoveram cenas aterradoras e per­versas, que o paciente atual associou inconscientemen­te aos fenômenos desafiadores da atualidade.
Comportamentos sexuais promíscuos dos adultos, sob a observação infantil ignorante, expressões agres­sivas e temerárias, que não puderam ser absorvidas nem superadas pela criança, tormentos decorrentes de agres­sões físicas e morais destituídas de compaixão e respei­to, não podendo ser liberadas, por associação condu­zem a vítima ao estado de despersonalização.
O corpo passa a ser detestado, e a falta de um con­ceito como de uma imagem corporal saudável, empur­ra-o para o atendimento dos impulsos sexuais mais primários e de maneira promíscua.
Quando o corpo, porém, é recuperado pelo dis­cernimento, e toma-se aceito, ganhando vida e signifi­cado, modifica-se-lhe o comportamento sexual para melhor, equilibra-se-lhe a conduta emocional, fácilita­se-lhe a aspiração da busca do amor e do afeto, pela necessidade de relacionamento estimulador e prazen­teiro.
Muitas vezes, também, os pais, inadvertida ou conscientemente, passam a nutrir pelo descendente, um sentimento apaixonado, no qual está oculto o desejo de um relacionamento sexual perverso, anu­lando-lhe a natural constituição da personalidade, que se deveria ir firmando a pouco e pouco de for­ma correta.
Essas condutas estranhas e esdrúxulas de mui­tos pais, com características incestuosas, refletem os seus próprios conflitos e perturbações, que os não auxiliaram no desenvolvimento de um comporta­mento pessoal saudável, tanto quanto de um desen­volvimento sexual harmônico.
Aturdidos e viciados mentalmente, vêm nos fi­lhos somente objetos para o autoprazer, preservan­do a sua personalidade incompleta e insatisfeita in­teriormente.
A reconquista da personalidade, no entanto, épossível, mediante a recuperação dos movimentos e da respiração, por meio de exercícios de reflexão e auto-análise, eliminando as associações negativas e buscando-se, racionalmente direcionar a ocorrência dentro do quadro de valores que possui, sem supe­restima, nem mecanismo traumatizante.
A aquisição da personalidade equilibrada está no relativismo do ego para com o Self, nas aspira­ções do corpo para com as da mente, no processo de busca de valores e de vivências geradores de alegria e portadores de paz.
Dentro do quadro da psicogênese da desperso­nalização, é-nos possível também adir, que muitos aspectos desse terror procedem de vivências em outras experiências carnais, passadas, que imprimi­ram suas marcas tão profundamente, que somente na juventude e na idade adulta o inconsciente con­segue liberar em forma de clichês e recordações que passam a confundir e a atormentar, aprisionando os seus agentes nesses cárceres da respiração insufici­ente e dos movimentos paralisados.
Todos os fatos que são praticados pela crueldade, pela insensatez e vilania, mesmo quando ocorre o fe­nômeno biológico da morte, não desaparecem, porque os danos morais continuam gerando conseqüências, até que o seu causador se recupere e reorganize a paisa­gem moral afetada.
Conhecendo a própria debilidade, e consciente do abuso perpetrado, o ser transfere de uma para outra experiência carnal a carga das responsabilidades, sen­do compulsoriamente convidado à regularização. Es­sas reminiscências emergem como consciência culpa­da, terrores sem próxima justa causa, ansiedade, atitu­des autopunitivas e autodestrutivas, que lhe alteram o comportamento pessoal, modificando, totalmente a personalidade que fica marcada.
Quanto mais se consiga autoconscientização das responsabilidades para com o corpo e para com o Espí­rito, mais facilmente se fazem a luta pela preservação da saúde física e mental, e as experiências propiciado­ras do progresso moral e cultural, que contribuem para a existência realmente feliz.

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