Como se verifica pela leitura do Velho Testamento, os judeus
eram extremamente meticulosos no que dizia respeito à limpeza,
quer em sua vida privada, quer nas práticas cerimoniais de seu
culto.
Preocupavam-se sobremaneira com toda e qualquer forma de
contaminação exterior, cumprindo à risca as regras severíssimas
estabelecidas pelo rabinismo quanto à alimentação e à vestimenta,
assim como aos holocaustos ou sacrifícios oferecidos no templo.
O Levítico, livro das leis judaicas, chega ao exagero de proibir
certos atos devocionais a quem apresenta deformidades, a saber:
se for cego, coxo, de nariz pequeno, grande ou torcido, se tiver
quebrado o pé ou a mão, se for corcovado, se remeloso, se tiver
belida no olho, se portador de sarna ou impigem.
.
.
(21:17 a 20.
)
Jesus, todavia, longe de dar atenção a esse formalismo de
somenos importância, conhecendo a incúria geral para com os
verdadeiros mandamentos de Deus, indicou, mais de uma vez, a
necessidade de curarmos, com maior empenho, as mazelas e
sujidades de nosso íntimo, pois são estas que nos impedem a
entrada no Reino dos Céus.
Assim é que, a um fariseu, por quem fora convidado a jantar
em sua companhia e que consigo fazia reparos por não ter Ele, o
Mestre, lavado as mãos antes de sentar-se à mesa, disse sem
rebuços: “Vós outros pondes grande cuidado em limpar o exterior
do copo e do prato; entretanto, o interior de vossos corações está
cheio de rapinas e de iniquidades”.
(Lucas, 11:37 a 39.
)
De outra feita, respondendo à mesma censura feita a seus
discípulos, chamou o povo para perto de si e assim se expressou:
“Escutai e compreendei bem isto: Não é o que entra na boca que
macula o homem; o que lhe sai da boca é que o macula.
O que sai
da boca procede do coração e é o que torna impuro o homem,
porquanto do coração é que partem os maus pensamentos, os
assassínios, os adultérios, as fornicações, os latrocínios, os falsos
testemunhos, as blasfêmias e as maledicências.
Essas são as
coisas que tornam impuro o homem”.
(Mateus, 15:1 a 20.
)
Em nova oportunidade, como completando a elucidação desse
ponto, ao perceber que seus discípulos procuravam afastar
algumas crianças que lhe eram trazidas para que Ele as
abençoasse, falou-lhes severamente: “Deixai que venham a mim
as criancinhas e não as impeçais, porquanto o Reino dos Céus é
para os que se lhes assemelham.
Digo-vos, em verdade, que
aquele que não receber o Reino de Deus como uma criança, nele
não entrará”.
(Marcos, 10:13 a 15.
)
Deduz-se, pois, dos ensinos de Jesus, que impureza de coração
não significa apenas malícia e abuso dos prazeres sexuais, mas
também a fatuidade, o orgulho, o interesse egoísta e outras falhas
morais, cujas manchas são bem mais difíceis de remover do que
aquelas existentes na superfície das coisas.
Dizendo que o Reino dos Céus é para os que se assemelham às
crianças, quer com isso dar a entender que, enquanto não alijarmos
de nós os pensamentos vulgares, a linguagem descuidada e as
ações desonestas (no sentido mais amplo do termo), adquirindo a
candura, a humildade e a simpleza personificadas na infância, não
estaremos em condições de comparecer à presença de Deus.
Cuidemos, então, do refinamento de nossas ideias e maneiras,
para que, um dia, ainda que longínquo, possamos ter a ventura de
“ver a Deus face a face”! (Mateus, 5:8.
)