Nos mecanismos do comportamento humano há um destaque especial para o prazer, que faz parte do processo da evolução. A busca do prazer, nunca é demais insistir no assunto, constitui estímulo vigoroso para a luta. Face a isso, quando algo inesperado e desagradável acontece, logo as pessoas afirmam que não têm nenhuma razão para viver, somente porque um insucesso, que talvez as amadureça mais, despertando-as para outras realidades, lhes aconteceu, tisnando-lhes a capacidade de discernimento para a eleição entre o verdadeiro e o falso.
Normalmente se estabelece que vida feliz é aquela que apresenta as criaturas sorridentes, bem dispostas, com expressão donairosa, destacadas no grupo social, mas que, além da máscara afivelada na face, conduzem sofrimentos, inseguranças, incertezas sobre si mesmas e aqueles que as cercam.
A busca do prazer, em razão das necessidades mais imediatas e dos gozos mais fortes, tem sido dirigida para os divertimentos: os alcoólicos, o sexo, o tabaco, quando não as drogas aditivas e perturbadoras. Esses ingredientes levam a diversões variadas, extravagantes, fortes, mas não ao verdadeiro prazer, que pode ser encontrado em uma boa leitura, em uma paisagem repousante, em uma convivência relaxadora, em uma caminhada tranqüila ou em um jogging, em um momento de reflexão, de prece, numa ação de socorro fraternal, em uma recepção no lar proporcionada a alguém querido ou simplesmente a um convidado a quem se deseja distinguir… Há incontáveis formas de prazeres não necessariamente fortes, que se transformam em sensações que exaurem e exigem repouso para o refazimento.
O prazer deve dilatar-se no sistema emocional, continuando a proporcionar bem-estar, mesmo depois do acontecimento que o desencadeia.
O divertimento tem duração efêmera: vale enquanto é fruído, logo desaparecendo, para dar lugar a novas buscas.
Algo que parece uma conquista ideal tem o valor essencial do esforço pelo conseguir, deixando certo travo de insatisfação após logrado.
Como conseqüência, há uma grande necessidade de parecer-se divertido, o que sinaliza como ser ditoso, triunfante no grupo social.
Os divertimentos, nem sempre prazeres legítimos, multiplicam-se até às extravagâncias e aberrações, violências e agressividades, para substituirem o fastio que os sucede, em razão de não poderem preencher as necessidades de bem-estar, que são as realmente buscadas.
Roma imperial, que também se notabilizou pela busca de divertimentos contínuos, passou dos jogos gregos, que foram importados para as lutas de gladiadores, nas quais o vencido era apenas humilhado na sua força, até às exigências de suas vidas, quando sucumbiam despedaçados, enquanto os diletantes sorriam, aplaudindo freneticamente os vitoriosos de um dia… Na sucessão das exorbitâncias, o divertimento mais apetitoso passou a ser aquele que obrigava as vidas a serem estioladas das formas mais originais, para não dizer cruéis, que se possa imaginar. A variedade dos jogos e dos divertimentos ultrapassava a imaginação sempre fértil na criação de novos atrativos.
Foi uma das características da decadência do Império, porque as pessoas perderam o senso do prazer, passando para o divertimento da crueldade.
Através dos tempos foram modificados esses processos, não erradicados os divertimentos alucinados.
Mesmo hoje, na época das conquistas valiosas do pensamento e do sentimento, dos direitos humanos, da preservação ecológica, os divertimentos prosseguem tão bárbaros, senão mais apetecíveis na mídia, por exemplo, que se utiliza das paixões primevas do ser, para estimulá-lo mais aos divertimentos do sexo explícito, da brutalidade sem limites, da vulgaridade insensata, da nudez agressiva e vil, do mercado das sensações, enquanto o público, sempre ávido quão insatisfeito, exige espetáculos mais burlescos e brutais, na vida real, através das lutas de boxe, entre animais, da tauromaquia, e, quando cansado desse pequeno circo de loucura, das guerras hediondas que arrasam cidades, países e destroem vidas incontáveis, mutilando outras tantas que ficam física, psicológica e mentalmente esfaceladas.
Quanto mais divertimentos, mais fugas psicológicas, menos prazeres reais. Onde proliferam, também surgem a crueldade, a indiferença pelo sofrimento alheio, a ausência da solidariedade, porque o egoísmo deseja retirar o máximo proveito da situação, do lugar, da oportunidade de fruir e iludir-se, como se fosse possível ignorar os desafios e os conflitos, somente porque se busca anestesiá-los.
As pessoas divertidas parecem felizes, mas não o são. Provocam risos, porque conseguem mascarar os próprios sentimentos, em um faz-de-conta sem limite. Demonstram seriedade, mesmo nos seus divertimentos, o que provoca alegria, bulha e encantamento de outros aflitos-sorridentes, mas, passado o momento, volvem à melancolia, ao vazio em que se atormentam. A descontração muscular e emocional é forjada, não espontânea, nem rítmica, proporcionadora do prazer que harmoniza interiormente.
É natural que surjam, agora ou depois, vários, terríveis processos conflitivos na área da personalidade e no âmago da individualidade. Tais conflitos não serão resolvidos com gargalhadas ou com dissimulações, mas somente através de terapia conveniente e grande esforço do paciente, que se deve autodescobrir e encontrar as razões perturbadoras do estado emocional em que se encontra. O jogo escapista de um para outro divertimento somente complica o quadro, por adiar a sua solução.
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